SAÚDE — O ÚLTIMO ESTÁGIO DO DESIGN

Valter Augusto Reynaldo
7 min readFeb 10, 2020

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UM BREVE RELATO DE ELIAS

É tarde da noite do dia 28 de novembro de 2018, Elias está em sua casa se preparando para ir dormir quando sua esposa reclama de fortes dores no estômago. Elias dá para sua esposa o remédio que tem em casa para aliviar as dores. Já se passaram 2 horas e as dores ainda continuam, então ele resolve levá-la até o Hospital para que fosse atendida por um médico e medicada.

Chegando ao Hospital Elias nota que existem poucas pessoas na sala de espera então imagina que o atendimento será rápido. Ele se dirige ao guichê de atendimento, enquanto Angela, sua esposa, aguarda na sala de espera. A funcionária do Hospital realiza o primeiro atendimento com perguntas básicas sobre a situação da sua mulher e pede para que Elias e sua esposa aguardem o atendimento.

Ambos se dirigem à ala de espera, para aguardar o atendimento. Sua esposa ainda se encontra com muitas dores. Após pouco mais de 15 minutos eles ouvem a enfermeira na sala ao lado gritar:

- ANGELA!

Elias e Angela se levantam e vão para uma outra sala, onde encontram a enfermeira com a sua ficha na mão. Ela faz algumas perguntas básica sobre seu estado de saúde enquanto mede a pressão e a temperatura.

A pressão e temperatura estão dentro do que é considerado normal, então a enfermeira pede para que ambos voltem para a sala de espera enquanto aguardam o médico chamá-los. Elias então nota que existem mais 4 pessoas também aguardando pelo atendimento e aos poucos os nomes são chamados.

Já se passaram 45 minutos que Elias chegou ao Hospital e ainda não foi atendido pelo médico e ainda tem mais duas pessoas aguardando atendimento, ele não sabe se é o próximo ou se será atendido após as duas pessoas. Então para sua surpresa ele escuta o médico chamando de uma sala distante o nome da sua esposa. Ambos se levantam e seguem o som da voz do médico.

Passam por uma porta, chegam até a sala onde fizeram o atendimento com a enfermeira e não veem o médico. A enfermeira indica que é a próxima sala, eles então encontram o médico que faz o atendimento rápido, indica uma medicação e pede para que sua esposa fique em observação até o final da medicação.

O médico então entrega a ficha para sua esposa e pede para que eles levem até a enfermeira. Elias volta sem saber para qual enfermeira entregar

- É a ficha do médico? Pode levar para aquela enfermeira ali — Indicou o vigia.

Elias então entrega a ficha para a enfermeira que já prepara a medicação enquanto encaminha sua esposa para a sala de observação.

Chegando lá Elias percebe que existem mais pessoas na sala, algumas pessoas com machucados e outras aparentemente muito doentes. A enfermeira então aplica o soro na sua esposa e pede que Elias chame a enfermeira quando a medicação estiver acabado.

Já é quase 3 horas da manhã. Angela dorme e o soro aparentemente já acabou. Já se passaram quase 3 horas desde que Elias chegou ao Hospital e ele chama a enfermeira, ela tira o soro da sua mulher e pede que eles aguardem o médico fazer a avaliação. Após mais 20 minutos o médico chama sua esposa, ambos se dirigem até a sala do médico, após uma rápida avaliação o médico passa alguns remédios para sua esposa tomar no dia seguinte e da alta para ela.

Após quase 4 horas que saíram de casa, Elias e Angela voltam novamente para casa.

A SAÚDE E SEU COMPLICADO ECOSSISTEMA

No design da experiência do usuário, podemos passar semanas ou meses realizando pesquisas com usuários, conceitualizando e ajustando um design para um recurso ou sistema. Estabelecemos o problema e buscamos soluções. Também deliberamos sobre o uso de controles e componentes, discutimos paletas de cores e branding. E isso geralmente aborda apenas uma pequena parte de um sistema ou um único recurso. Mas os ecossistemas são maiores que o recurso disponível. E o mapa da jornada muitas vezes não abrange todo o ecossistema da experiência do usuário.

A Saúde tem um ecossistema complexo, os pacientes viajam através de uma infinidade de sistemas e unidades para receber seus cuidados. Um paciente com enxaqueca, por exemplo, terá um mínimo de três recursos, entre atendentes, enfermeiros e médicos diferentes durante sua jornada de atendimento. Esses recursos podem ou não compartilhar o mesmo prontuário e, portanto, podem não coordenar o mesmo cuidado. Se esse paciente fosse hospitalizado, o hospital pode ter uma equipe de atendimento diferente e usar um outro tipo prontuário.

Tudo isso causa ainda mais complicação na hora de um atendimento dentro do Hospital, pois ele é apenas uma peça dentro de toda a engrenagem da saúde.

Para minimizar os danos aos pacientes que procuram um Hospital era necessário criar um grande projeto de melhorias no atendimento baseado na experiência dos pacientes que utilizam o Hospital.

VENDO OS PROBLEMAS DE PERTO

Para criar proximidade com o problema era preciso ver de perto como as coisas acontecem, ver as dores e necessidades não só dos pacientes, mas também dos funcionários, que muitas vezes passam horas e horas sem descanso. Para isso foi realizada uma pesquisa ampla que contou com entrevistas, telefonemas e por fim ver de perto o funcionamento do hospital.

Foram mais de 15 dias de pesquisas, entre conversas e telefonemas foi possível notar uma grande dor em comum, a necessidade de um contato mais humanizado entre pacientes e funcionários. E após uma quantidade enorme de dados foi possível mapear todos os passos dos funcionários e pacientes que utilizavam o hospital.

Avaliação média de 6.8 pontos.

ENTENDENDO A EXPERIÊNCIA DO PACIENTE

Com a jornada dos usuários completa foi possível notar quais os pontos mais críticos que poderiam ser melhorados, pontos como o momento em que os pacientes aguardam o médico por exemplo, foi normal vermos pacientes dizerem coisas como “Que demora”, “Não temos informações de nada” e até “Que cadeira mais desconfortável”. Uma análise fria e de fora poderia sugerir que melhorando as cadeiras e colocar placas de informações seriam o suficiente para que os pacientes tivessem uma experiência melhor durante sua passagem pelo Hospital.

O que nós procuramos quando vamos a um Hospital?

Essa era a chave de todo o problema, conseguindo resolver essa questão, seria possível melhorar consideravelmente a experiência dos usuários. Nós não procuramos uma cadeira confortável ou uma placa. Nós queremos basicamente sermos curados ou ter nossas dores aliviadas.

Quando um paciente chega ao hospital ele está com uma carga emocional muito pesada, geralmente já está com dores e problemas que vão muito além do que um simples remédio pode curar. E como podemos ajudá-lo?

CHEGOU A VEZ DOS ESPECIALISTAS

Para chegarmos às melhores soluções era preciso apresentar o panorama completo das experiências dos usuário a quem mais entende do assunto, médicos, enfermeiros, recepcionistas, motoristas e funcionários das mais diversas áreas do Hospital.

Para isso realizamos um Workshop de Ideação para que eles entendessem as dores dos pacientes que chegam ao Hospital e pudessem sugerir ideias para diminuirmos um pouco o sofrimento de quem procura um Pronto-Socorro.

Médicos, o Diretor do hospital, recepcionistas, enfermeiras ,motoristas e cozinheiras sugeriram idéias, todos iguais, e depois todos compartilharam suas idéias e votaram nas que gostaram mais. Todos com o mesmo número de votos. Com isso chegamos a mais de 90 idéias e dessas, 8 foram priorizadas e escolhidas para serem implantadas

Algumas soluções já foram implantadas e foi realizado novamente a pesquisa onde a média que antes era de 6.8 agora já chegamos a 8.1. E ainda faltam várias soluções para serem implantadas.

UMA LUZ NO FIM DO TÚNEL

Não é uma simples andar por aí aplicando Design Centrado nas Pessoas e Design Thinking em um projeto. É por isso que existem UX Designers, treinados para fazer esse tipo de trabalho como meio de vida. Infelizmente, não existem UX Designers de Hospitais e Clínicas por perto. Precisamos mudar isso para tornar os cuidados de saúde mais baratos, mais acessíveis e mais seguros, pois a saúde, deve ser o último estágio do Design.

“Design não é apenas o que parece e o que se sente. Design é como funciona.”
Steve Jobs

Referências

https://medium.com/@drgylesmorrison/bad-healthcare-ux-is-still-killing-people-be3270f281b3

https://modus.medium.com/ux-ecosystems-in-healthcare-4c244c386253

https://medium.com/s/user-friendly/why-i-design-in-healthcare-ux-eacf251d78ad

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